terça-feira, 29 de setembro de 2009

BRIGA DE MARIDO E MULHER


Nunca antes na história desse País, viu-se tamanha pisada na bola diplomática. Os condutores da política externa brasileira faltaram à aula do professor Millôr Fernandes. Assim, na ignorância - vamos supor ser esta a razão -, acabaram metendo a colher em um angu hondurenho de forma  tão desnecessária quanto estúpida. E o pior, sem manter a recomendável equidistância dos contendores, como deveria ser em homenagem  à autodeterminação dos povos.

Em Honduras, na verdade, dois grupos se enfrentam, observando os fatos sob lentes da verdade bastante diferentes. Para alguns, houve um golpe militar que derrubou e sequestrou o presidente legítimo, Manuel Zelaya, suspendeu as garantias constitucionais e instalou no poder o oligarca Roberto Micheletti. Para outros, entrentanto, o então presidente atentou  contra a Constituição local ao propor mudanças em  garantias pétreas de alternância no poder,  implicando na pena incondicional da perda do cargo,  o que ocorreu somente após devido processo legal perante o Poder Judiciário.


O Brasil foi levado ao centro do "imbroglio" ao receber Manuel Zelaya em sua Embaixada em Tegucigalpa.

Acontece que o angu tem caroço. Ninguém com mais de três anos de idade acredita na versão oficial, segundo a qual o Mel, como é carinhosamente chamado o deposto, bateu às portas do Embaixador Brasileiro, de surpresa, vindo do exílio, carregando suas malinhas, seu chapéu e sua disposição para lutar pela presidência. Insistir nisso ofende, magoa As autoridades brasileiras sabiam e pactuaram com a entrada clandestina. E para quê? Para acirrar os ânimos, quando o momento era para buscar diálogo.

Com certeza, essa circunstância não caracteriza busca de asilo. Ao contrário, o refúgio político se dá quando alguém, injusta e politicamente perseguido, necessita de garantias de segurança para sair do País. Sair, entendeu, Celso Amorim? Ir para fora.

Assim, se o Brasil não reconhece o Governo instalado, não mantém com ele relações diplomáticas. Não mantendo relações diplomáticas, para as autoridades locais nossa Embaixada em Tegucigalpa é apenas um prédio abrigando um cidadão local condenado pela Justiça.

Por outro lado, com todos os holofotes internacionais na crise, chutar o pau-da-barraca e invadir o que seria território brasileiro não ia ficar nada bonito na fita, para as autoridades hondurenhas. Ainda mais em se tratando de um País tão simpaticão como o nosso. Impasse...

Uma guerra com Honduras era só o que nos faltava.

Nossos diplomatas poderiam ajudar a sair do enrosco. O Presidente Lula tem a obrigação de fazê-lo. Mas precisariam aprender a lição do Millôr: "ser diplomata é discordar sem ser discordante".



Cayo Menor - Cayo Cochinos - Honduras
(by Kirsten Hubbard)

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O HINO E A LEI


Ontem começou a primavera. Com ela, a vigência da Lei n.º 12.031, a qual institui a obrigatoriedade da execução, uma vez por semana, do Hino Nacional Brasileiro nas escolas públicas e privadas de ensino fundamental.

Não sem razão, a ordem legal vem logo após a publicidade dada à, digamos, apresentação da cantora Vanusa no Primeiro Encontro de Agentes Públicos na Assembléia Legistaviva de São Paulo. Quem ainda não assistiu o espetáculo pode acessar em http://www.youtube.com/watch?v=6w9MpztV4gk&feature=fvw, mas se prepare para uma cena de forte constrangimento.

Chegou-se a noticiar que a loira estava bêbada, mas ela atribuiu suas condições à ingestão de um remédio para labirintite associado a um calmante. De uma cantora, dita, profissional, o mínimo que se espera quando convidada (contratada?) para um evento desses, é o conhecimento da letra da música a ser executada. Mas... atire a primeira pedra quem não tropeça nos rococós poéticos do nosso Hino.

Convenhamos, o poema não é fácil. Contudo, contém versos e imagens de profunda beleza. Mais que isso, retrata as atitudes e comportamentos que, no dia-a-dia, manifestam - ou deveriam manifestar - os cidadãos brasileiros assumidos como fundamentais para a vida coletiva do povo brasileiro.

Resgatar nosso patriotismo, manifestado tão bravamente a cada quatro anos nas Copas do Mundo, é tarefa árdua para uma Nação castigada pela violência em todas as suas manifestações,  maltratada pelas carências de alimento do espírito e do corpo, que vai se submetendo a uma horda de gestores corruptos, cercados de interesseiros e "fantasmas".

Obrigar as crianças a cantar a música de Francisco Manuel da Silva, com letra de Joaquim Osório Duque Estrada, não é uma solução. No entanto, desde que se ensine os sentidos por trás das palavras, pode ser um bom passo. 

Assim, parafraseando a crônica de Cecília Meirelles, a primavera do civismo chegará, "mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la."

"Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu."
Cecília Meirelles



domingo, 20 de setembro de 2009

RANKING PLAYBOY DE QUALIDADE DE VIDA E A INDENIZAÇÃO

"As dez melhores cidades brasileiras para a população masculina heterossexual viver, beber e transar".
Esse foi o título de uma das matérias da edição de abril de 2001 da Revista Playboy (Editora Abril). Entre as "Top 10" da categoria se encontrava Natal, a paradisíaca capital do Rio Grande do Norte, pelas seguintes razões:
"Nossos observadores notaram a disposição das potiguares: militantes da boa e sagrada festança. A beleza e a receptividade das potiguares pôde ser conferida na praia de Ponta Negra, a 15 minutos do centro. Elas estão ali, desacompanhadas, tomando cerveja gelada nas barraquinhas. Fora que os pesquisadores anotaram o número surpreendente de 61,4% de garotas que tomam tequila. Isso tudo ao som de rock. Com o aditivo mexicano então, o que já é fácil, fica melhor ainda."
Ilustrava a "reportagem" - se é que se pode chamar assim - a fotografia de uma jovem, tomando banho de sol, na praia citada. A editora, no entanto, não teve o cuidade de pedir autorização da fotografada para exibí-la como "militante da boa e sagrada festança".

O baixo calão da matéria publicada - ainda não achei um termo adequado.... - ofende a dignidade da brasileira em geral, das cidades ali mencionadas de forma mais particular, e, de uma maneira bem específica, as mulheres  cuja imagem não autorizada ilustra os textos.

Esta semana, o Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação imposta pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte para que a Editora Abril indenizasse a natalense exibida  indevidamente nas páginas da revista (veja em http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200800145070&pv=000000000000)

Esse tipo de baixaria - desisti, não vou achar um termo publicável para descrever lixo editorial - concorre para transformar nossas cidades em destino de preferência para o deplorável turismo sexual. As vítimas dessa empreitada, normalmente, são as vulneráreis, muitas vezes, as menores de idade. O Brasil não precisa dessas visitas.

Há algum tempo, uma amiga foi a praia (a mesma Ponta Negra) com seu filho. Enquanto a criança brincava por perto, ela foi abordada por um "turista" oferecendo cinquenta euros para que ela o acompanhasse ao seu hotel. Ela respondeu que era pouco. Ele aumentou a oferta para setenta euros. Ainda era pouco. Quando ele lhe perguntou quanto custaria, a resposta foi defintiva: sempre será pouco!

A indenização fixada no processo não vai recompor a honra ofendida. Nem vai restaurar a imagem da cidade de Natal ou das natalenses. Sempre será pouco! Mas, em certa medida, deve servir para que a Editora , pelo menos, tenha mais cautela.


 Morro do Careca - Praia de Ponta Negra
(por Nelson Boeira Jr.)

sábado, 19 de setembro de 2009

O QUE HOJE É

"O homem tem pressa em saber do que ele realmente é feito, como se fabrica um homem, como se dá a vida. Em toda parte, não obstante a sofreguidão da busca, resta a certeza de que, graças ao bem da ciência, tendo decifrado o código humano, teremos garantido não somente a nossa sobrevivência, mas da própria vida. Alheios a tanto empenho, crecem a ameaça e o temor do fim dos tempos."
Essas palavras intoduzem a investigação filosófica em desenvolvimento pela minha amiga Soraya Guimarães Hoepfner na gelada península nórdica, sobre a tecnologia da informação, baseada  no pensamento de Martin Heidegger acerca da relação entre homem e liguagem.

Pouco sabia eu de Heidegger, além da limitada e preconceituosa idéia de que, em algum momento de sua trajetória, ele fora simpático à causa nazista. Minha amiga, fazendo-me ir além dos conceitos superficiais, mostrou que em determinado ponto do percurso de seu pensamento, Heidegger olhou para o que é [Einblick in was das ist], para o hoje e pensou o modo como somos em meio ao avanço da ciência e da técnica moderna. Notadamente, ele tematizou, lá pelos anos dourados, a questão da cibernética e a idéia da informação.

Em apertadíssima síntese, o substancial de suas formulações sobre a técnica moderna assenta-se em três pontos: na compreensão de unidade desse fenômeno, por ele definida como enquadramento [Ge-Stell]; no entendimento de que é a ciência quem está fundada no modo imperativo existencial dessa própria técnica, e não o contrário; e, de um modo ainda mais original, na posição [Stellung] do homem que, nesse contexto, é aquele que corresponde a uma provocação [Herausforderung], em suma, o homem é tecnocientífico porque responde ao apelo de desvelar do mundo.

Pois bem, Sô. Enconrajado por você, inicío uma modesta jornada de reflexão sobre "o que hoje é", com auxílo dessa ferramenta de exposição ao mundo. Inauguro meu "blog" para expor algumas idéias, discutir nosso cotidiano. Eu não diria "enquadrado". Talvez, integrado a uma técnica que permite alcaçar tempos e espaços, a bem poucos anos, inimagináveis. Mas, definitivamente, correspondendo à provocação dos vetiginosos fatos aos meus pensamentos. Pensamentos de um paulista, advogado, há mais de 15 anos se enraizando em Natal, Estado do Rio Grande do Norte, Brasil.

Espero contar com a participação e o auxílio de muitos, na construção de um mosaico e, em certa medida, alimentar a esperança na possibilidade humana.

Natal, despertar da primavera de 2009.


"A linguagem é a casa do ser. Em seu lar habita o homem. Os pensadores e os poetas são os guardiões desse lar." Martin Heidegger