segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

DO COMEÇO AO FIM SEM O MEIO


Uma relação incestuosa e homossexual é o argumento forte do novo filme do Aluísio Abranches, "Do Começo ao Fim". Ao contrário do chocante "Um Copo de Cólera", nesta produção o cineasta optou por uma abordagem sutil. Tão sutil que chega a aparentar inexistência de conflito. Conflito que deveria ser a mola mestra do filme. O sub-texto é rico, mas fica-se com a impressão de que a história, na verdade, não foi filmada, ela passa ao largo da câmera.

Tudo é belo, harmônico e feliz, como numa propaganda de margarina. As perdas na vida dos personagens centrais - em 30 segundos de filme, o mais velho perde o pai, a mãe dos dois também morre, a govertanta-amiga-confidente da família se muda sem contar (pelo mesmo para o público) a razão e para onde, e o pai do mais novo deixa a casa (sob a alegação, forçadíssima, de que estava mais do que na hora dos dois morarem sozinhos) - constituem os pontos mais angustiantes da trama (eu escrevi "trama"?).

Talvez tenha sido intencional, mas o único momento em que é manifestado um ligeiro desconforto com a relação de Tomás e Francisco, ocorre em uma fala do padastro do mais velho e pai do mais novo, interpretado apenas corretamente pelo Fábio Assunção:  "eu não estou sabendo lidar com essa situação", diz ele à mãe dos dois (esta sim, brilhantemente vivida por Júlia Lemertz), para, na sua aparição seguinte, mostrar-se o mais compreensivo dos pais-padastros.

E é só. No mais, muitos sorrisos e romance tão açucarado que o filme deveria alertar os riscos para os diabéticos. Algumas cenas beiram a pieguice. Outras são piegas mesmo. Se a idéia era narrar uma história de amor possível diante dessas circunstâncias, 15 minutos de filme teriam sido suficientes.

Logicamente, a simples menção da relação retratada é provocativa e não foi a intenção fazer um filme redentor ou levantar bandeiras. É um romance. Uma história de amor, um amor complexo simplificado pela mão de Aluísio Abranches.
O maior equívoco, no entanto, decorre do próprio título. É retratada a infância dos dois irmãos, o princípio da intimidade inocente e amor fraterno; e a vida aduta, a entrega física e o estabelecimento de uma relação verdadeiramente homoafetiva. Mas, cadê o meio? A adolescência é, por si só, um período de conflitos psicológicos pra qualquer um. O que dizer, então, de dois irmãos apaixonados, desejosos um do outro? Para o Aluísio Abranches, aparentemente, Tomás e Francisco não passaram por isso, ou ele não achou relevante narrar como eles ultrapassaram essa fase.



Um comentário:

  1. Oi Renato,
    muito interessante é sua análise do filme!
    Bjs,
    Ângela

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